O presente artigo pretende se debruçar sobre o reconhecimento fotográfico como instrumento probatório, demonstrando, a partir de estudos experimentais na área de psicologia, que a memória é facilmente sugestionável pelo emprego de imagens em um geral. Levando em consideração a inquestionável indução proporcionada por imagens, cuja capacidade inclui até mesmo a efetiva criação integral de lembranças, o reconhecimento fotográfico para fins judiciais deve ser adotado com extrema cautela, pois é capaz de provocar injustiças irreparáveis cuja causa é simplesmente a falibilidade humana. A princípio, o ordenamento jurídico pátrio não vislumbrou a utilização de imagens fotográficas para fins de reconhecimento, porém a jurisprudência atual e pacífica orienta-se por essa possibilidade, empregando, por analogia, o procedimento previsto para o reconhecimento pessoal, contido no artigo 226 do Código de Processo Penal.

1.Reconhecimento fotográfico e os enganos da memória

“ Testemunha (Arland Avery – tio do réu): Outros detetives me disseram que, naquele momento, eles tinham uma foto de Stevie, da antiga ficha de prisão. Então o xerife adjunto Eugene Kusche, fez um desenho baseado naquela foto, em vez de fazer usando a descrição dela [vítima – Sra. Penny Beerntsen]. Mostraram o desenho para a Sra. Beerntsen, que disse: “Sim, é ele.” Depois pegaram a foto da prisão e montaram um grupo de suspeitos. E a Sra. Beerntsen escolheu aquela foto.

Defensora Pública de Steven (Reesa Evens): Se olhar a descrição de Penny Beerntsen em relação a altura, peso, cor dos olhos (olhos castanhos), Steven não se encaixava na descrição. Nem o cabelo (longo), nem o corpo (robusto). Ele não se encaixava na descrição. Mas Judy Dvorak (delegada) disse que sim. Mostraram a foto de Steven para Penny Beerntsen, depois ela viu os suspeitos, e Steven é a única pessoa que ela já viu antes. Além disso, ela ouviu o subxerife (Eugene Kusche) dizendo: ‘Acho que parece esse cara.’ Isso é muito sugestivo.

(…)

Advogado pós condenação de Steven (Robert Henak): Steven Avery tinha testemunhas para cada minuto desde às 13h30 até pelo menos 17h. A vítima foi agredida sexualmente aproximadamente às 15h50. Todas as testemunhas de álibi declararam que, no dia da agressão, Steven Avery estava ajudando os pais e outros parentes a concretar o ferro-velho. O caminhão de concreto chegou entre 13h e 14h. Testemunhas confirmaram que estavam lá fora, trabalhando com ele, despejando concreto, ou estavam dentro de casa, assistindo a Divorce Court, das 15h às 15h30, e viram Steven Avery imediatamente após. Depois, Steve Avery levou a irmã no carro 4×4 até uma mina de cascalho local. Ficaram encalhados lá e desencalharam o carro. Eles voltaram aproximadamente 16h.

(…)

Juiz do caso (Fred H. Hazlewood): A Sra. Beerntsen era uma testemunha muito boa. Era muito positiva. Ela disse que, enquanto o crime estava sendo cometido, ela fez questão de se lembrar do atacante. E isso… isso prevaleceu.”1

Steven Avery nasceu no Condado de Manitowoc, Wiscosin, no leste dos Estados Unidos. Sua família era dona de um conhecido ferro-velho de carros na região e o modo de vida, mais apartado da sociedade, e não raramente envolvidos em pequenos delitos, lhes rendeu uma fama de desordeiros. No entanto, a história de Steven extrapolou esses meros preconceitos locais e as corriqueiras delinquências características de sua família. Os eventos criminosos nos quais se envolveu deram margem a uma série de polêmicas e controvérsias, servindo de palco, inclusive, para uma série televisiva americana que pretendia tornar público o desconforto das injustiças vivenciadas por este interiorano norte-americano.

Um dos marcantes episódios da turbulenta história de Steven Avery ocorreu em 1985, quando contava com 23 anos, e foi declarado culpado por agressão sexual, tentativa de homicídio e cárcere privado. A condenação ordenava 32 anos de prisão, de maneira que Steven deveria permanecer preso até 2017. Não obstante, em 2003, após 18 anos atrás das grades, foi solto por conta do resultado superveniente de um exame de DNA, que atestou que o verdadeiro autor do crime era Gregory Allen, conforme outros envolvidos já haviam alertado. As diferenças entre ambos (comprimento dos cabelos, cor dos olhos, estrutura física, etc. – figura 1) foram objeto de destaque pela própria vítima no depoimento prestado logo após o ilícito, como se denota do excerto extraído do próprio seriado e colacionado no início deste artigo. Entretanto, induzida por parte da equipe policial, a vítima reconheceu em um sujeito estranho o seu agressor. Diferentemente dos relatos iniciais fornecidos pela vítima, Steven Avery não possui as características marcantes do agressor, como cabelos longos e olhos castanhos, porém a influência da imagem apresentada e a verossimilhança das assertivas foram definitivas para o reconhecimento.

Neste contexto, parece que o ponto de choque do julgamento paira justamente sobre o reconhecimento fotográfico.

O caso de Steven, se isolado, já provocaria perplexidade e desconforto, afinal prender por 18 anos um inocente é, incontestavelmente, um grave erro. No entanto, a situação é muito mais crítica, pois há outros muitos casos semelhantes ao vivenciado por Steven que, apesar de menos populares, são igualmente danosos. Isso porque, em que pese o fato de o reconhecimento fotográfico constituir método de prova legal e largamente utilizado, apresenta falhas severas, por diversos os motivos. Perpassam as razões por traços psicológicos da própria vítima, como seus valores e suas vivências, preconceitos, traumas, ânsia por “justiça”, até por efeitos mais momentâneos como emoção, confusão, indução, entre outros.

Não é novidade que a memória possa ser desvirtuada como um dos efeitos deletérios do tempo ou de influências externas às quais a vítima foi exposta, durante ou posteriormente ao delito. Nessa esteira, se o artigo anterior3 concentrou-se na criação de falsas memórias por percepções distorcidas da realidade, este artigo pretende igualmente abordar os subterfúgios da mente humana e as falsas memórias, porém sob um outro prisma, qual seja, o da indução e das distorções provocadas por imagens em sede de reconhecimento fotográfico.

A memória é elemento vulnerável. Tão humana quanto aqueles a que serve, repleta de falhas objetivas e subjetivas. É seletiva. Se de um lado, para amainar o sofrimento, transforma aquilo já visto, ressignificando o vivenciado, de outro é tão insegura e volátil, que é capaz de preencher os espaços em branco da lembrança por uma imagem recém-vista. A memória manipula e é manipulável, de forma que a lembrança que protege, pode ser a mesma que faz enganar. A memória é a salvação, mas também é o perigo de recordar conforme seja mais fácil de aceitar.

Atento às nuances da mente humana, AURY LOPES JR. alertou:

“Também se devem considerar as expectativas da testemunha (ou vítima), pois as pessoas tendem a ver e ouvir aquilo que querem ver e ouvir. Daí por que os estereótipos culturais (como cor, classe social, sexo etc.) têm uma grande influência na percepção dos delitos, fazendo com que as vítimas e testemunhas tenham uma tendência de reconhecer em função desses estereótipos (exemplo típico ocorre nos crimes patrimoniais com violência – roubo – em que a raça e perfil socioeconômico são estruturantes de um verdadeiro estigma).”4

Neste ponto encontra-se o grande perigo do reconhecimento fotográfico: a sugestionabilidade das percepções. Diante de uma inegável tendência a perceber a realidade como melhor convém, ainda que inconscientemente, o reconhecimento fotográfico é capaz de potencializar os aspectos negativos do reconhecimento pessoal por revisitar, de maneira altamente influenciável, o autor do delito.

Segundo um dos vários estudos conduzidos nos Estados Unidos (Wilson & Westerman, 2018) uma única fotografia é capaz de desencadear uma série de ideias, pensamentos e até mesmo interferir em percepções sensoriais5 , transformando experiências vividas – ou até mesmo criando vivências -, pois as fotos tem o condão de materializar “forte evidência”, mesmo daquilo que não ocorreu – o que é chamado pelos americanos como “truthiness effect”6 .

As implicações práticas são duas:

I – Em um contexto de incertezas, é cômodo aceitar a proposta do outro, o que torna fácil a indução.

Lembrar, intrinsecamente, significa reconstruir. Essa reconstrução, por sua vez, nem sempre é uma tarefa simples, seja pela carga emocional envolvida, seja porque no momento do delito há uma série de detalhes que passam despercebidos. Por conta disso, se – com boas ou má intenções – são apresentadas informações verossímeis, minimamente compatíveis com o que se recorda, o obscuro pode ser facilmente substituído pelo falso.

Em experimento realizado nos Estados Unidos, foi apresentado aos participantes um falso evento relativo à infância de cada um, em tese contado por um integrante da própria família. Desses participantes, 25% se lembraram total ou parcialmente de terem se perdido no shopping, recordando, portanto, um fato fictício somente em função da indução e da verossimilhança (LOFTUS & PICKRELL, 1995).7

LOFTUS, em conjunto com dois outros pesquisadores da Universidade de Pádua e da Universidade da Califórnia (SACCHI, AGNOLI & LOFTUS, 2007)8 , operacionalizou um outro experimento cujo escopo igualmente era verificar a sugestionabilidade da memória, porém, dessa vez, pelo uso exclusivo de imagens. Assim, com o intuito de investigar como fotos editadas influenciavam a percepção de eventos públicos passados, foram selecionadas e apresentadas, a um universo de aproximadamente 300 estudantes da Universidade de Pádua, fotos relativamente conhecidas – originais e editadas – de dois episódios públicos da história, dos quais eles não participaram, sendo um mais recente, protesto na cidade de Roma contra a guerra no Iraque (2003), e outro mais antigo, protesto na praça Tiananmen, Beijing, contra o governo (1989). Somente com base na apresentação dessas fotos, que apesar de adulteradas eram verossímeis, os alunos tiveram as percepções acerca dos eventos transformadas. Com relação ao protesto em Roma, a impressão foi de que o evento foi mais agressivo do que efetivamente foi, e, em relação ao protesto de Beijing, o evento ganhou maiores proporções.

Há ainda um terceiro estudo, que confronta imagem e experiências autobiográficas. Uma equipe de quatro pesquisadores (WADE, GARRY, LEAD & LINDSAY, 2002)9 elaborou um teste, pelo qual 20 (vinte) participantes eram convidados a olhar fotos supostamente de sua infância e relembrar os eventos nelas retratados. As fotografias verdadeiras foram fornecidas por membros das famílias dos participantes e, dentre elas, inseriu-se uma foto fictícia da criança andando de balão. De um universo de 20 participantes, 50%, ou seja dez deles, disseram lembrar-se do passeio de balão, sendo que desses dez, quatro disseram lembrar-se integralmente, e seis parcialmente.

Os estudos logram demonstrar que as imagens não simplesmente conseguem adicionar/modular detalhes, mas são capazes de gerar efetivamente uma maior propensão a aceitação de falsas informações. Não só, verifica-se, inclusive, um nítido caminho mental de se buscar na memória aquilo que se passou a entender como verdade. Assim, mais do que simplesmente influenciar, parece que as imagens são realmente capazes de transformar, ou até criar, lembranças.

Essa tendência, muito embora assustadora, justifica-se porque as pessoas percebem as fotografias como uma evidência convincente de que os eventos apresentados realmente aconteceram, bem como porque as imagens fotográficas representam uma rica fonte de informações sobre os detalhes perceptíveis (LINDSAY, HAGEN, WADE & GARRY, 2004)10 .

II – As fotos mostradas podem se conectar a aspectos da própria vítima ou testemunha, como preconceitos arraigados (principalmente étnicos e socioculturais), ideias pré-concebidas com base em outras vivências, ou ainda, “contaminação” por relatos de terceiros. Isso conduz à dramática situação em que a imagem é capaz de adequar o autor do delito ao projetado na fotografia, por conta do reconhecimento do “criminoso nato”11 .

Nessa linha, situações hipotéticas, porém lamentavelmente verossímeis, poderiam ser: (i) o sujeito que assaltou era branco, assim como a vítima, porém quando da ocorrência do delito, havia um pardo no ambiente. Por conta de preconceito socioeconômico, é possível que haja no momento do reconhecimento uma transferência12, por maior “facilidade” da vítima em aceitar/acreditar que o pardo cometeu o crime; ou ainda, (ii) quem cometeu o delito foi uma pessoa branca, mas pelo fato de se vestir mal e parecer desfavorecido economicamente, a vítima identifica o branco como pessoa parda; ou ao inverso, (iii) quem cometeu o crime foi uma pessoa parda muito bem vestida e, por se vestir bem e parecer ter uma condição socioeconômica avantajada, o pardo é reconhecido como uma pessoa branca.

Isso porque, detalhes que podem ser absorvidos das fotos misturam-se com produtos da imaginação a fim de criar memórias vívidas do evento (real ou falso). A dificuldade na reconstrução do evento somada ao aumento de lembrança ocasionado pela fotografia – ainda que de maneira alterada – elevam sobremaneira as chances de distorção dos fatos para conforto próprio (CARDWELL, HENKEL, GARRY, NEWMAN & FOSTER, 2016)13 .

Muito embora o tema desperte uma sensação de contemporaneidade, fato é que o uso da imagem como instrumento de manipulação da memória é sabidamente empregado desde o século passado (Século XX), no mínimo.

O recurso de edição de imagens foi largamente utilizado pelo governo Soviético como estratagema de eliminação de inimigos e marketing do partido comunista. Um “retoque” frequente utilizado por Josef Stalin era a exclusão de seus desafetos das fotos:

“Uma série de instantâneos mostra uma linha do tempo de arrepiar a espinha: na primeira foto (acima), Stalin aparece cercado de quatro camaradas; na próxima, datada de 23 anos mais tarde, três deles desapareceram; na terceira, ele aparece sozinho em um cartão postal.

Os que faziam parte do seleto círculo interno que perderam a simpatia do líder foram simplesmente apagados das imagens oficiais: a manipulação fotográfica era chave para reescrever a história soviética. ‘É uma das nossas preocupações hoje – as imagens são muito convincentes, mas elas também são facilmente manipuláveis’, diz Gale.”15

A exclusão dos personagens guardou estrita relação com a intenção de Stalin de apagar registros e, portanto, apagar da consciência popular a figura de Leon Trotsky. Em que pese Stalin, Lênin e Trotsky tenham sido aliados para execução da revolução em 1917, após a consolidação do poder comunista, Trotsky, entre 1925 e 1929, foi vencido em uma disputa interna dentro do Partido Comunista, da qual saiu vencedor o stalinismo. Stalin, por isso, decidiu eliminá-lo da história, fazendo com que todos os registros fotográficos nos quais Trotsky aparecia fossem alterados. Assim, a foto original (canto superior esquerdo), que contava com Nikolai Yezhov, Josef Stalin, Lênin e Trotsky (da esquerda para direita) foi gradualmente alterada por 23 anos, conforme as animosidades surgiam, restando, por fim, a última, que virou cartão postal, exclusivamente com a figura de Josef Stalin (canto inferior direito). Era nítida a intenção de que a população esquecesse Trotsky, o que, consequentemente, enfraqueceria a linha política por ele adotada.

Obviamente que, na hipótese de reconhecimento fotográfico em sede de inquérito policial ou no âmbito de processo judicial, o pressuposto não é a utilização de imagens editadas. A questão não é a veracidade ou autenticidade das fotos coletadas, mas os sentimentos que podem exsurgir da visualização dessa imagem, que corrobora para a criação do “criminoso nato” 16. Dependendo das imagens e do momento em que são colocadas à disposição da vítima, a verossimilhança pode influir no reconhecimento, acentuando estigmas ou a criação de falsas impressões, falsos encaixes.

Nesse sentido, a fotografia pode ser considerada ainda pior que o reconhecimento pessoal, na medida em que o tempo de exposição à imagem do suposto autor do delito pode ser muito maior.

Essas considerações quanto à sugestionabilidade da mente humana, em juízo, devem ter atenção redobrada, pois podem implicar em severas ameaças, tais quais as vivenciadas pelos inúmeros Steven Avery’s, cujas vidas, apesar de não serem transformadas em enredo de seriado, filme ou novela, são drasticamente afetadas pelo erro 17 – que, diga-se de passagem, é várias vezes induzido – como bem salienta AURY LOPES JR.:

“Muitas vezes, antes da realização do reconhecimento pessoal, a vítima/testemunha é convidada pela autoridade policial a examinar “álbuns de fotografia”, buscando já uma pré-identificação do autor do fato. O maior inconveniente está no efeito indutor disso, ou seja, estabelece-se uma “percepção precedente”, ou seja, um pré-juízo que acaba por contaminar o futuro reconhecimento pessoal. Não há dúvida de que o reconhecimento por fotografia (ou mesmo quando a mídia noticia os famosos “retratos falados” do suspeito) contamina e compromete a memória, de modo que essa ocorrência passada acaba por comprometer o futuro (o reconhecimento pessoal), havendo uma indução em erro. Existe a formação de uma imagem mental da fotografia, que culmina por comprometer o futuro reconhecimento pessoal. Trata-se de uma experiência visual comprometedora.

Portanto, é censurável e deve ser evitado o reconhecimento por fotografia (ainda que seja mero ato preparatório do reconhecimento pessoal), dada a contaminação que pode gerar, poluindo e deturpando a memória. Ademais, o reconhecimento pessoal também deve ter seu valor probatório mitigado, pois evidente sua falta de credibilidade e fragilidade.”18

2.Reconhecimento fotográfico no Direito brasileiro

O reconhecimento por meio de fotografia configura prova atípica no Direito processual penal pátrio, isso significa dizer que não guarda previsão expressa no Código de Processo Penal. Não obstante essa lacuna, na prática, a sua utilização não implica em qualquer prejuízo, pois é pacífico o uso desse método na qualidade de prova inominada, em sede pré-processual ou mesmo processual, em razão dos princípios da busca da verdade real e/ou da liberdade na produção das provas.

Ainda, em relação à sua natureza, tratando-se de prova inominada, definiu-se que o procedimento a ser observado para o reconhecimento fotográfico deve ser, por analogia, o mesmo procedimento previsto para o reconhecimento pessoal (art. 226 do CPP19), considerando-se, para tanto, o reconhecimento por fotografia como substituto da segunda etapa: “O reconhecimento possui três fases; (1) descrição da pessoa ou coisa; (2) comparação da pessoa ou coisa com outras semelhantes; (3) indicação da pessoa a ser reconhecida.”20

Infelizmente, a prática revela-se bastante diferente, sendo habitual a mitigação do procedimento completo, como enaltece o juiz e professor Guilherme Nucci:

“Infelizmente, o reconhecimento, tal como determina a lei, não vem sendo executado em vários juízos; que se limita a apontar o réu como autor do crime. Na verdade, cuida-se apenas de uma prova testemunhal, envolvendo um reconhecimento sem qualquer formalidade, logo, de valor relativo. alega-se falta de recursos materiais e humanos para a sua realização. Em face disso, substitui-se o conjunto de formalidades pelo denominado reconhecimento informal, efetivado por testemunha, em sala de audiências.

O reconhecimento de alguém, feito por meio de fotografia, é prova de validade controversa, pois a segurança pode ser comprometida. Por isso, é fundamental que haja vários outros elementos de prova a ratificar o reconhecimento fotográfico, formando-se conjunto probatório sólido.”21

Dessa forma, ante as falhas advindas do reconhecimento fotográfico, seja pela própria natureza, seja pelo simplório método empregado na sua utilização, o Supremo Tribunal Federal condicionou a valoração da prova obtida por reconhecimento fotográfico ao amparo de outros elementos de prova, como se verifica da jurisprudência pacífica que há tempos se mantém:

STF: “O reconhecimento fotográfico tem valor probante pleno quando acompanhado e reforçado por outros elementos de convicção. Habeas corpus indeferido”22 .

O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, segue a mesma linha lógica, quanto à viabilidade de usar o reconhecimento fotográfico, se devidamente corroborado por outros elementos de prova:

STJ: “ Este Superior Tribunal tem se posicionado no sentido da validade do reconhecimento fotográfico, desde que não seja utilizado de forma isolada, mas esteja em consonância com os demais elementos constantes dos autos. No caso em análise, o reconhecimento fotográfico apenas corroborou os indícios de autoria, a justificar o regular processamento da ação penal, até porque do inquérito policial colacionado aos autos observa-se que existiram outros elementos para embasar a denúncia oferecida pelo Ministério Público, como as declarações prestadas pelas vítimas e testemunhas. (…) Habeas corpus não conhecido”.23

Entretanto, e como já mencionado, o “procedimento de segurança” previsto pelo artigo 226 do Código de Processo Penal, que deveria ser aplicado por analogia, mesmo que relativamente simples, é comumente deixado de lado ou executado precariamente, sob o pretexto de falta de recursos, ou pior, sob a alegação de configurar mera “recomendação”. Não só, percebe-se uma tendência, especialmente pelo Superior Tribunal de Justiça, de legitimar a flexibilização dos passos previstos no artigo 226 do CPP, como se depreende dos julgados abaixo:

STJ: “(…) O Superior Tribunal de Justiça entende que a inobservância das formalidades legais para o reconhecimento pessoal do acusado não enseja nulidade, por não se tratar de exigência, apenas recomendação, sendo válido o ato quando realizado de forma diversa da prevista em lei, notadamente, quando amparado em outros elementos de prova. (…) Agravo regimental não provido”.24

STJ: “(…) Este Superior Tribunal sufragou o entendimento de que o reconhecimento fotográfico, como meio de prova, é plenamente apto para a identificação do réu e fixação da autoria delituosa, desde que corroborado por outros elementos idôneos de convicção (HC n. 22.907/SP, Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJ 4.8.2003), assim como ocorreu in casu, em que o reconhecimento pessoal feito na fase inquisitiva foi confirmado em juízo e referendado por outros meios de prova, estes produzidos em sede judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. O reconhecimento pessoal isolado não anula o ato, sendo que a presença de outras pessoas junto ao réu é uma recomendação legal e, não, uma exigência (HC n.41.813/GO, Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ 30.5.2005). Agravo regimental improvido.”25

Obviamente, em um mundo ideal, o procedimento na íntegra não deveria ser afastado por nenhum argumento, na medida em que o princípio basilar da hermenêutica jurídica se expressa pelo brocardo: “a lei não contém palavras inúteis” (verba cum effectu sunt accipienda), logo, se está em lei, deveria ser cumprido em sua integralidade. Deixar ao arbítrio do juízo aferir a necessidade do procedimento é uma anulação velada e indevida, conforme alerta Gustavo Badaró:

“Tem prevalecido o entendimento de que o reconhecimento pessoal não é ato probatório obrigatório na instrução da causa, ficando sujeito ao ‘prudente arbítrio do juiz’. Discorda-se, pois assim considerar é violentar flagrantemente o direito à prova, o reconhecimento pessoal é medida eficaz e, sem dúvida, pertinente, tanto para que o Ministério Público comprove a autoria delitiva, quanto para que a defesa demonstre a negativa de autoria. Condicionar o direito à prova ao arbítrio do juiz é anulá-lo!”26

Sem que se firme neste momento qualquer posicionamento crítico, o que se nota a partir da análise jurisprudencial é que a teoria da fonte independente vem sendo adotada pelos tribunais superiores há alguns anos, flexibilizando sobremaneira o procedimento previsto no art. 226, como ensejador de nulidade. Outro exemplo claro nesse sentido reflete-se no julgamento ocorrido em agosto de 2004, quando a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal entendeu que

“eventuais vícios do inquérito policial não contaminam a ação penal. O reconhecimento fotográfico, procedido na fase inquisitorial, em desconformidade com o artigo 226, I, do Código de Processo Penal, não tem a virtude de contaminar o acervo probatório coligido na fase judicial, sob o crivo do contraditório. Inaplicabilidade da teoria da árvore dos frutos envenenados (fruits of the poisonous tree). Sentença condenatória embasada em provas autônomas produzidas em juízo.”27

Admite-se, portanto, que eventual irregularidade cometida no curso do inquérito policial, em razão do descumprimento do rito estabelecido no art. 266, CPP, seja sanada na fase judicial, caso o juízo processante constate a existência de outras provas produzidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, cujo resultado guarde harmonia com o apurado no reconhecimento fotográfico. Entretanto, neste ponto é importante fazer um breve adendo, não se trata de repetir a prova, mas de encontrar guarida nas demais provas produzidas, pois como bem salienta GUSTAVO BADARÓ, embora formalmente possível a reprodução da prova, sua repetição resultaria em medida materialmente inócua ou inadequada:

“Por exemplo, um reconhecimento pessoal realizado sem a observância do rito probatório do art. 226 do CPP, em que um único suspeito seja levado à presença da vítima para que esta o reconheça – ou não – como autor do crime. Mesmo que tal prova, com resultado positivo, seja anulada, é de se questionar a possibilidade se repetir tal ato posteriormente, segundo o rito adequado, em virtude do grande potencial de sugestionabilidade que a que a prova ilegitimamente produzida causa. No segundo ato de reconhecimento, a vítima provavelmente reconheceria o acusado não porque se lembraria dele na cena delitiva, porque se recordaria dele no reconhecimento ilegítimo anterior.”28

Sob outro prisma, a precariedade do reconhecimento fotográfico, na condição de único elemento a embasar a justa causa para a ação penal, enseja a rejeição da denúncia por ausência de requisitos mínimos (art. 41 do CPP), como já registrou uma das signatárias deste artigo, em julgado que porta a seguinte ementa:

“PROCESSUAL PENAL E PENAL: TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 41 DO CPP. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS INDICIÁRIOS MÍNIMOS. INADMISSIBILIDADE DE DEFLAGRAÇÃO DE AÇÃO PENAL. FALTA DE JUSTA CAUSA EVIDENTE. TEMERIDADE DO CRITÉRIO ELEITO PARA LASTREAR A EXORDIAL ACUSATÓRIA. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE VÍNCULO DO PACIENTE COM OS FATOS IMPUTADOS. DENÚNCIA OMISSA EM RELAÇÃO À DESCRIÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS ELEMENTARES. I – O exame dos elementos indiciários que lastrearam a denúncia permite concluir que a instauração do processo criminal contra o paciente baseia-se em uma foto precária, de difícil ou impossível reconhecimento, supostamente do paciente, ingressando no escritório de um dos réus, que em tese realizava operações ilícitas de investigação, bem como na condição societária e familiar do paciente, sócio e ex-cunhado, de outro réu, que em tese contratava tais investigações. II – As fotos são precárias; a denúncia não foi precedida de inquérito policial; o paciente sequer prestou esclarecimentos; não houve perícia prévia ou reconhecimento formal do paciente por meio das referidas fotos. III – As investigações policiais foram cautelosas no sentido de apontar a possibilidade de ser, nas mencionadas fotos, o paciente. (…) X – A denúncia, tal como posta, não preenche os requisitos necessários à viabilização da instauração da ação penal. XI – Concedida a ordem de habeas corpus para trancar a ação penal nº 2005.61.81.002929-6, em relação ao paciente Carlos Bernardo Torres Rodenburg, ficando assegurado ao Ministério Público Federal oferecer nova denúncia, acaso obtidos elementos indiciários que permitam vincular o acusado aos fatos delituosos.”29

A conclusão que se chega, portanto, é no sentido de que, embora o procedimento contido no artigo 226 do Código de Processo Penal confira certa segurança à validação do reconhecimento fotográfico, na prática é rara sua rigorosa observância; não só, ainda que se sigam todos os procedimentos ali previstos, é possível que ainda assim se constate ineficiência decisiva para amparar uma condenação lastreada exclusivamente no reconhecimento pessoal ou, para o escopo deste artigo, no reconhecimento fotográfico.

O ponto chave em relação ao reconhecimento fotográfico, portanto, é a sua admissão como instrumento-meio e não como ato probatório autônomo. Ainda que se proceda ao trâmite do artigo 226 do Código de Processo Penal, o valor do reconhecimento pessoal/fotográfico deve ser sempre aferido em conjunção aos demais elementos de prova, podendo consubstanciar ponto inicial, mas nunca um fim em si mesmo, isso porque, como afirma Gustavo Badaró, constitui a “mais falha e precária das provas”30 , por todos os elementos já explorados.

3.Conclusão

Muito embora se revista de praticidade e agilidade, parece ser claro que o reconhecimento fotográfico, seja na fase pré-processual ou mesmo em juízo, é medida frágil e precária, devendo ser evitado a todo custo e, quando não o puder ser, que seja valorado a partir de amplo e consistente conjunto probatório, como forma de evitar injusta condenação.

Fato é que as imagens fotográficas diminuem sobremaneira as chances de um reconhecimento confiável, eis que são inúmeras as variáveis a serem ponderadas, tais como a qualidade da própria imagem, ou ainda, alterações intencionais, que são cada vez mais fáceis de serem realizadas. Ademais, independentemente desses fatores adstritos exclusivamente à imagem em si, nos deparamos com os riscos inerentes ao próprio reconhecimento, como preconceitos, estereótipos, vivências anteriores e afins.

Não bastassem os fatores objetivos e interpretativos, o reconhecimento fotográfico, acima de tudo, deve ser evitado pela influência irreversível que pode causar na memória da vítima ou testemunha, pois, uma vez admitida como verdade a falsa fotografia, nunca mais se retornará ao status quo ante para que se proceda, de forma genuína, a um novo reconhecimento. Todas essas cautelas devem ser rigorosamente observadas, principalmente em um cenário que o reconhecimento vem sendo feito à revelia do seu procedimento orientador (art. 226 do Código de Processo Penal), o que se constatou ser prática frequente no mundo jurídico.

A conclusão, portanto, é que, se o reconhecimento pessoal por si só já é temerário em face da falibilidade da memória humana, o reconhecimento fotográfico acrescenta outros importantes elementos de vulnerabilidade, que tornam a sua utilização ainda mais frágil e complexa. A influência de uma imagem sobre a reconstrução dos fatos pode ser arma letal, cujo poder é historicamente conhecido.

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WILSON, J.; WESTERMAN, D. (2018). Picture (im)perfect: Illusions of recognition memory produced by photographs at test. Memory & Cognition, 46(7), 1211.


1 DEZOITO anos perdidos (Temporada 1, ep. 1). Making a Murderer [Série Netflix]. Direção: Laura Ricciardi e Moira Demos. Produção: Laura Ricciardi, Moira Demos, Lisa Nishimura e Adam Del Deo. Estados Unidos: Synthesis Films, 2015. HDTV. 64 minutos, son., color.

2 Figura 1 – Imagem retirada do endereço eletrônico [https://www.bustle.com/articles/143281-gregory-allens-first-parole-hearing-is-coming-up-a-stunning-development-in-the-making-a-murderer]. Acesso em: 23.09.2019.

3 MELLO, Maria Cecilia Pereira de; GERVITZ, Luiza Cobra. Se não me falha a memória – Breve discussão sobre a suscetibilidade da prova testemunhal. In: Revista de Direito e Medicina. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019. v. 2.

4 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 311.

5 “The mere presence of a photo may call forth a range of related thoughts, ideas, and sensory evocations. This subjectively experienced cascade of semantically misattributed to prior experience due to the ease with which they come to mind (Cardwell et al., 2016)” – Wilson, J., & Westerman, D. (2018). Picture (im)perfect: Illusions of recognition memory produced by photographs at test. Memory & Cognition, 46(7), 1211.

6 WILSON, J.; WESTERMAN, D. (2018). Picture (im)perfect: Illusions of recognition memory produced by photographs at test. Memory & Cognition, 46(7), 1211.

7 LOFTUS, E.F.; PICKRELL, J.E. (1995). The formation of false memories. Psychiatric Annals, 25, 720-725. Esse estudo conduzido por ELIZABETH LOFTUS foi o percursor de diversos trabalhos dela e de outros pesquisadores, cujos resultados chegam a conclusões semelhantes acerca da persuasão da memória.

8 STRANGE, D.; GARRY, M. (2007). Changing history: doctored photographs affect memory for past public events. Applied Cognitive Psychology, 21(8), 1005-1022.

9 WADE, K.; GARRY, M.; READ, J.; LINDSAY, D. (2010). A picture is worth a thousand lies: Using false photographs to create false childhood memories. Psychonomic Bulletin & Review, 9(3), 597-603.

10 LINDSAY, D., Hagen, L., Read, J., Wade, K., & Garry, M. (2004). True Photographs and False Memories. Psychological Science, 15(3), 149-154.

11 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 15. Ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 311.

12 “Outra variável é a “transferência inconsciente”, quando a testemunha ou vítima indica uma pessoa que viu, em momento concomitante ou próximo àquele em que ocorreu o crime, dentro do crime, geralmente como autor. Citam os autores o estudo de BUCKHOUT, que simulou um roubo na frente de 141 estudantes e, 7 semanas depois, pediu-lhes que reconhecessem o assaltante em um grupo de 6 fotografias. Sessenta por cento dos sujeitos realizaram uma identificação incorreta. Entre eles, 40% selecionaram uma pessoa que viram na cena do crime, mas que era um inocente espectador. LOFTUS obteve resultados similares em experiências do gênero.

O “efeito compromisso” (GORENSTEIN y ELLSWORTH) é definido quando ocorre uma identificação incorreta (por exemplo, quando a pessoa analisa muitas fotografias e elege erroneamente o sujeito) e posteriormente realiza um reconhecimento pessoal.

Nesse caso, o agente tende a persistir no erro, advertindo os autores de que não se deve proceder ao reconhecimento pessoal depois do reconhecimento por fotografias, pois há um risco muito grande de que ele mantenha o compromisso anterior, ainda que tenha dúvidas.” – LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 311.

13 CARDWELL, B.; HENKEL, L.; GARRY, M.; NEWMAN, E.; FOSTER, J. (2016). Nonprobative photos rapidly lead people to believe claims about their own (and other people’s) pasts. Memory & Cognition, 44(6), 883-896.

14 Endereço eletrônico: [https://pt.wikipedia.org/wiki/Falsifica%C3%A7%C3%B5es_de_fotografias_na_Uni%C3%A3o_Sovi%C3%A9tica]. Acesso em: 21.09.2019.

Outro interesse eletrônico que faz a interface entre os impasses políticos de Stalin e a edição de fotos podem ser acessadas no endereço eletrônico: [https://br.rbth.com/historia/81289-photoshop-sovietico-propaganda-stalinista]. Acesso em: 21.09.2019.

15 Endereço eletrônico: [https://www.bbc.com/portuguese/vert-cul-42810209]. Acesso em: 21.09.2019.

16 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 311.

17 Sobre os erros no sistema norteamericano de justiça, ELIZABETH LOFTUS coloca: “Usually the scrambled memory does not matter very much. But if you are an eyewitness to a crime, your scrambled recall could send someone to prison.And, rather than feeling hesitant, you might feel perfectly sure of the truth of your memory.The history of the United States justice system, like those of other countries, is littered with wrongful convictions made on the basis of mistaken memories. Huff recently estimated4 that about 7,500 people arrested for serious crimes were wrongly convicted in the United States in 1999. He further noted that the rate is thought to be much lower in Great Britain, Canada, Australia, New Zealand and many other nations, especially those that have established procedures for reviewing cases involving the potential of wrongful conviction.” – LOFTUS, E.F. (2003). Our changeable memories: Legal and practical implications. Nature Reviews Neuroscience, 4, 231-234.

18 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 312.

19 Art. 226. Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á pela seguinte forma:

I– a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida;

Il– a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la;

III– se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela;

IV– do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais.

Parágrafo único. O disposto no inc. III deste artigo não terá aplicação na fase da instrução criminal ou em plenário de julgamento.

20 BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 470.

21 NUCCI, Guilherme de Souza. Processo Penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 174.

22 STF, 2ª Turma, HC 74.267/SP, Rei. Min. Francisco Rezek, DJ 28.02.1997.

23 STJ, 6ª Turma, HC 238.577/SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 6.12.2012, DJe 18.12.2012.

24 STJ – AgRg no REsp 1.266.170/RS, Relator: Min. Rogério Schietti Cruz, 6a Turma, j. 25.08.2015, DJe 11.09.2015.

25 STJ – AgRg no REsp 1.399.900/SP, Relator: Min. Sebastião Reis Júnior, 6a Turma, dj. 17.03.2015, DJe 26.03.2015.

26 BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 470.

27 STF – HC nº 83.921/RJ, Relator: Min. Eros Grau, 1a Turma, dj. 03.08.2004, Dje 27.08.2004.

28 BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 398.

29 TRF3 – HC nº 35.704 SP, Relatora: Des. Cecilia Mello, dj. 03.10.2006.

30 “O reconhecimento pessoal já foi apontado como a mais falha e precária das provas. A principal causa de erro no reconhecimento é a semelhança entre as pessoas. A avaliação do valor probatório do reconhecimento envolve um fator essencial: o confronto entre a descrição antecipadamente feita e os traços físicos da pessoa identificada. Por isso, é necessária a estrita observância do procedimento probatório previsto no art. 226 do CPP, para que o reconhecimento pessoal possa ser validamente valorado como prova. O reconhecimento fotográfico tem sido aceito como meio de prova válido, desde que não seja possível a realização do reconhecimento pessoal. O principal argumento para a aceitação do reconhecimento fotográfico é, justamente, que se trataria de um ‘meio de prova atípico’. Todavia, o reconhecimento fotográfico não é uma prova atípica, mas um meio de prova irritual, que vulnera o procedimento probatório previsto no art. 226, substituindo a segunda fase de comparação física e ao vivo da pessoa a ser reconhecida pela comparação fotográfica. Não se trata, pois, de um simples caso de prova atípica, que seria admissível ante a regra do livre convencimento judicial. As formalidades de que se cerca o reconhecimento pessoal são a própria garantia da viabilidade do reconhecimento como prova, visando a obtenção de um elemento mais confiável de convencimento. Diante da vulneração do procedimento probatório previsto no art. 226, o reconhecimento fotográfico não pode servir de fundamento para a condenação.” – BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 3ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 472.

Cecilia é coordenadora da Revista de Direito e Medicina editada pela Revista dos Tribunais.

Artigo publicado originalmente na Revista de Direito e Medicina | vol. 4/2019 | Out – Dez.

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