As controvérsias em torno das possíveis irregularidades contábeis e da recuperação judicial das Americanas escancarou outra vertente da administração em grandes empresas: os altos valores envolvidos em salários, bônus e outros benefícios pagos aos diretores

As controvérsias em torno das possíveis irregularidades contábeis e da recuperação judicial das Americanas escancarou outra vertente da administração em grandes empresas: os altos valores envolvidos em salários, bônus e outros benefícios pagos aos diretores.

Longe de pretender travar qualquer discussão sobre eventual discrepância de tais valores versus ganhos obtidos pela própria empresa, que podem até ser adequados a depender do caso, o que causa certa indignação é pensar em qual premissa maior esses pagamentos estão lastreados. E aqui, não há dúvida, os valores de bônus são parametrizados com metas atingidas, seja de vendas, de serviços, de contratos, seja, em síntese, de lucros obtidos em determinado período.

No caso das Americanas, foi noticiado que, entre 2020 e 2021, o valor médio pago a diretores praticamente dobrou, saltando de R$4,3 milhões para R$8,5 milhões. A proposta para 2022 previa uma média de R$11,8 milhões em salários, bônus e ações, estando o valor final, todavia, atrelado ao cumprimento de metas pelos executivos.

Ocorre que um executivo não atinge metas sozinho. Ele necessita de uma equipe, talvez uma grande equipe. Seguramente, de forma direta ou indireta, todos os funcionários de uma empresa são indispensáveis para que o objetivo seja atingido. Ainda que se deva guardar as proporções cabíveis e observar as respectivas funções, é evidente que o esforço de todos os colaboradores é fundamental para o sucesso da empresa. No entanto, o sistema atual falha em não recompensar satisfatoriamente as pessoas que mais contribuem para a organização ou, pelo menos, em não valorizar uma forma mais equânime de distribuição de lucros.

Conceder bônus milionários aos executivos da empresa sem oferecer incentivos significativos aos funcionários pelas mesmas metas que foram, também por eles, atingidas, é insustentável e injusto. Perpetua-se a sensação de impotência entre os funcionários, que tendem a se frustrar com a falta de oportunidades de reconhecimento e promoção.

Ao pretender interferir positivamente na aviltante desigualdade de renda encontrada no Brasil, precisa-se mudar o foco para que a distribuição de lucros objetive recompensar toda a força de trabalho, e não apenas os dirigentes de alto escalão. Isso incentivaria os funcionários, não só a atingirem metas, mas também a investirem em capacitação e estudo com a perspectiva real de melhor remuneração.

Haveria um sistema que se retroalimenta, considerando que os colaboradores, na certeza de obtenção de melhores rendimentos decorrentes da elevação dos lucros da empresa, dispensariam todos os seus melhores esforços na busca desse resultado, mais justo e igualitário.

Além disso, simultaneamente, ocorreria um impulso positivo para a economia brasileira, com aumento na circulação de riquezas e com maior percentual de indivíduos preparados para investir seus rendimentos e contribuir para o crescimento do país.

Portanto, se as empresas brasileiras desejam melhorar não apenas os seus ganhos, mas também as condições do país, devem priorizar medidas de justiça e equidade em toda a sua gestão, inclusive na distribuição dos lucros.

Artigo publicado no Monitor do Mercado.

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