Aspectos legais sobre a flexibilização das regras para o uso de vacinas no Brasil

Desde o anúncio feito pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) na semana passada sobre o fim da exigência de estudos da fase 3 em andamento no Brasil para autorização emergencial de vacinas, o governo brasileiro negocia a possibilidade de ampliar o leque de imunizantes disponíveis.

Logo depois da mudança de protocolo da Anvisa, o Ministério da Saúde já se reuniu com representantes do Laboratório União Química, responsável pela vacina russa Sputnik V no Brasil. A promessa, num primeiro momento, é de 10 milhões de doses.

De acordo com o Ministério da Saúde, a previsão é de que o país receba 400 mil doses uma semana depois a assinatura do contrato, mais dois milhões um mês depois e outras 7,6 milhões de doses em até três meses. A previsão é de que o laboratório comece a produzir mais 8 milhões de doses por mês a partir de abril.

Outro laboratório que também promete entregar pelo menos 20 milhões de doses é o indiano Bharat Biotech: 8 milhões de doses da Covaxin já chegariam agora em fevereiro e mais 12 milhões em março.

Na última sexta-feira (5) a Anvisa recebeu pedido para que estudos da fase 3 da Covaxin sejam realizados no país. Por aqui, o imunizante deve começar a ser testado em março com prazo entre 45 e 90 dias, com previsão para o resultado em maio. A expectativa é de que sejam envolvidos 3 mil voluntários no estudo em cinco centros de referência.

No sábado (6) a Pfizer, farmacêutica norte-americana que produz a vacina Cominarty, em parceria com a empresa de biotecnologia alemã BioNtech, realizou pedido de registro definitivo da vacina contra a Covid-19 no Brasil. A Agência tem 60 dias para dar seu aval.

Com as mudanças, seriam a princípio cinco vacinas sendo aplicadas no país. Por enquanto duas tiveram uso emergencial aprovado: a Coronavac, através do Instituto Butantan em parceria com a Sinovac; e a da AstraZeneca em parecia com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Entenda a mudança

A alteração de protocolo atende a um momento de emergência sanitária e a necessidade das autoridades de saúde de disponibilizarem mais vacinas para a população. “Essa atualização faz parte da estratégia regulatória do Brasil de favorecer acesso. Ela está apartada de qualquer discussão que seja fora do âmbito técnico, para que o Brasil garanta que tenha acesso a vacinas com qualidade, eficácia e segurança”, explicou Meiruze Freitas, diretora da Anvisa.

Mesmo com a adaptação de protocolo, continua a exigência de estudo de desenvolvimento clínico da vacina na fase 3, mas a partir de agora esse estudo pode ser aprovado se os testes foram feitos no exterior. “A vacina deve preferencialmente possuir um Dossiê de Desenvolvimento Clínico de Medicamento (DDCM) anuído pela Anvisa e o ensaio clínico fase 3, pelo menos, em andamento e em condução no Brasil”, diz a redação da mudança de procedimento.

Assim, a fase 3 realizada no exterior precisará ter os mesmos critérios de segurança, qualidade e eficácia com as diretrizes técnicas exigidas por aqui, em território nacional pela Anvisa.

O laboratório que queira comercializar a vacina contra a Covid-19 precisa comprovar os dados brutos do estudo e acompanhar os participantes dos testes para indicar e comprovar a eficácia de pelo menos um ano. Também será preciso mostrar os estudos pré-clínicos e clínicos, desde que esses protocolos tenham aceitação por instituto de pesquisa aqui e lá fora.

“A única diferença vai ser a necessidade de apresentar dados que permitam que nós tenhamos confiança no estudo no exterior e que esse estudo mostre que a vacina serve para a população brasileira. E nós como agência reguladora vamos assegurar isso”, disse o gerente-geral de medicamentos da Anvisa, Gustavo Mendes.

Questões jurídicas de mudanças de protocolo

Normalmente uma mudança como essa, que afeta a vida de mais de 210 milhões de brasileiros, leva tempo e investimentos em dados técnicos e de avaliação – algo que dura anos, muitas vezes décadas.

Juridicamente, segundo os especialistas, estamos diante da chamada “discricionariedade técnica”, onde as decisões devem observar além do ordenamento jurídico, a finalidade da instituição: no caso, as políticas de saúde pública e o bem estar da população.

A modificação, na avaliação dos advogados, é relevante e favorece a ampliação da oferta de vacinas no Brasil. “Os ensaios de fase 3 de uma vacina são dispendiosos e levam alguns meses, desestimulando a oferta, no mercado interno, de vacinas já aprovadas em outros países. A demanda global é imensa, fazendo com que os fornecedores optem pelo caminho mais célere, sendo extremamente importante que o Brasil se mostre competitivo na aquisição das vacinas”, explica a ex-juíza federal no TRF-3, Cecilia Mello.

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